O beijo

Fui convidada para um jantar de antigos alunos da Escola.
O jantar era da turma de duas amigas minhas, dum Liceu diferente do meu.
Comecei por não querer ir, mas depois lembrei-me que os conhecia a quase todos.
Com 17 anos passava mais tempo no Liceu Camões, que no Filipa.
Tinham-me levado a minha grande amiga para lá e para estar com ela tinha que assistir a algumas aulas.
Não fui jantar, mas fui beber café.
Estava eu sentada a beber café, a observar as mudanças que 16 ou 17 anos faziam nas pessoas que andavam por ali de pé a rir, quando um dos "bonitos" (de outros tempos, mas que continuava giro) se senta ao pé de mim.
- Lembras-te de mim?
- Claro que me lembro.
- E já não usas baton com sabor a morango?
Fiquei com cara de parva.
- Não te lembras dos batons que vocês usavam naquela altura?
Fiz um esforço e acompanhei a memória dele.
- Uns frasquinhos transparentes que deixavam os lábios a brilhar, não era?
- Sim. Esses mesmos. Com sabor a morango...
- Nem me lembrava disso.
- E lembras-te de eu te perguntar se sabia mesmo a morango?
Eu ia-me lembrando:
- Lembro...
- Lembras-te do que me respondias?
- Queres provar?
E escangalhei-me a rir:
- Como é que ainda te lembras disso?
- Tem sido a minha fantasia. Eu queria provar, mas nunca tive coragem de te dizer.
Eu olhava para ele com um ar deliciado:
- Tu metias-te sempre comigo por causa do sabor a morango.
- E tu respondias-me sempre: "queres provar?". Arrumavas logo comigo e com todos os esforços que eu fazia.
- Pois era. Nunca tiveste coragem. E agora?
- Agora não sei o que hei-de fazer à minha vida, tu já não usas baton com sabor a morango...
- Isso é verdade. Queres provar sem baton? - disse a sorrir.
Ficou vermelho, como sempre ficava quando tinha 17 anos.
Foi salvo pelas minhas amigas que se vieram sentar ao pé de nós.
Fartou-se de me "ameaçar" com o dedo e com os olhos durante o resto do tempo.
Quando nos fomos embora, disse-me ao ouvido:
- Vou-me sempre penitenciar, por não ter tido coragem...

:)